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sexta-feira, 23 de julho de 2010

AMAZONIA URBANA

Amazônia urbana


A retirada dos não-índios da Raposa Serra do Sol ainda pode render mais algumas histórias. O que é natural. Com a reserva indígena decretada, inicia-se um novo ciclo e novas opiniões. Dou-lhes uma: "Saiam da Amazônia! Se a terra foi garantida para os índios, que a cultura deles também seja garantida." Não, não sou eu quem está dizendo, mas assinaria embaixo. E quem diz, então? O escritor manauense Milton Hatoum, conhecedor como poucos do mundo amazônico. Filho de imigrantes libaneses, nasceu em Manaus em 1952 e é ganhador de três Jabutis, o mais prestigiado prêmio literário no Brasil.
Suas palavras no parágrafo acima têm a ver com sua posição totalmente contrária à presença de evangélicos e quaisquer missionários na reserva Raposa Serra do Sol. Em entrevista à revista de História da Biblioteca Nacional deste mês, ele também ressalta que não se pode proibir o Estado de entrar em terras indígenas e se diz a favor de uma ocupação das fronteiras pelo Exército e pela Marinha.
Por quê? Para começar, os povos das fronteiras não são apenas brasileiros. Os índios do Alto Rio Negro, por exemplo, também são colombianos. Costumam se expressar no idioma próprio de sua tribo, falam tukano (etnia hegemônica), língua geral (nheengatu), português e alguns se comunicam em espanhol. Poliglotas. Inacreditável? Estive várias vezes por lá e pude constatar essa realidade desconhecida da maioria dos brasileiros.
Para se ter uma idéia, em São Gabriel da Cachoeira, o terceiro maior município do país, com 109.180 km² de extensão, 90% da população é indígena; prefeito tariano e sub-prefeito baniwa. Todos estão inseridos na vida econômica, política e cultural da região como agricultores, comerciantes, bancários, professores, vereadores, artesãos, pajés, militares, etc. Informatizados, têm internet e vivem misturados com os não-índios. Lá no Alto Rio Negro, fronteira com Colômbia e Venezuela, na chamada Cabeça do Cachorro.
Mas esse tipo de assunto parece interessar pouco aos outros habitantes do Brasil. E por me deparar volta e meia com posições sem pé nem cabeça relativas à Amazônia, fez-me um bem danado ler a entrevista de Milton Hatoum. Ele se queixa da visão estereotipada que estrangeiros e brasileiros têm do tema. Das pessoas não perceberem que existem "muitas Amazônias". E daí não admitirem que certas paisagens como as existentes em Roraima são totalmente diferentes das do médio Amazonas ou do Alto Rio Negro.
Outra coisa que o incomoda bastante é as pessoas do Brasil e do resto do mundo ignorarem a Amazônia urbana. Desconhecerem que cerca de 80% dos habitantes amazônicos estão nas cidades. "Metade de Manaus não tem água, e o maior rio do mundo está logo ali. Isso para mim é gravíssimo." Alguém tem dúvida de que Hatoum está com a razão? Porém, atenção. Nada disso significa que despreze a luta e propostas interessantes de preservação ambiental. Ele acredita que o manejo florestal é totalmente possível. Concorda com opções que vão de perfumes e cosméticos a plantas medicinais e uma variedade enorme de frutas. Entretanto, ressalta, tem que envolver os pesquisadores que moram na região. Gente do Museu Goeldi, do Inpa, da Embrapa, das universidades. "Infelizmente, essas pessoas não são ouvidas", lamenta.
E enfatiza que o estado do Amazonas preservou a floresta e destruiu a cidade. Algo que passa ao largo dos ecomilitantes. Manaus era ocupada por 300 mil pessoas em 1968 e hoje tem quase 2 milhões de habitantes; por causa da criação da Zona Franca, evidente. O crescimento caótico a transformou numa cidade violenta. Que não impediu a atração de executivos e técnicos de outras partes do Brasil (principalmente paulistas), coreanos, japoneses...
Quer dizer, a memória urbana manauense foi arrasada. E se Hatoum não contasse, poucos cariocas saberiam agora que havia uma linda praça em Manaus, a praça São Sebastião, "com pedras portuguesas, cujo desenho de ondas pretas e brancas inspirou Burle Marx para fazer o calçadão de Copacabana". Você sabia?Fonte:www,oglobo.globo.com

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